Os meus professores
Quando surgiu a divulgação da iniciativa para escolha do
melhor professor, muitos foram os textos, análises e divagações sobre o
assunto. Também eu pensei sobre a arte mas, na altura, optei por deixar passar
o tempo e a escrita para mais tarde.
Filha de professores. Sobrinha de professores. Prima de
professores. Em primeiro, segundo ou terceiro grau. E ainda os amigos
professores da mãe, do pai, dos tios e dos primos. Conheço, do início, os calos
da profissão, as dores no corpo e na alma, a vida de quem trazia (e traz) outras vidas
para casa.
Depois, há os meus professores. E, de entre eles, os
Professores. A Irmã Celeste, minha querida professora primária que, hoje, sabe
o meu nome completo e o de todos (ou quase) os alunos que lhe passaram pelas
mãos. Dela, fiquei com o rigor da escrita, a tabuada, a organização, os métodos
de trabalho. Ensinou-nos bem mais do que letras e números. Minha Irmã Celeste...
Cresci e veio a Irmã Lisete que, no 6.º ano, nos apresentou A Morgadinha dos Canaviais, Eurico, o Presbítero, As Cidades e as Serras,
como se fosse normal, aos onze ou doze anos, tratar quase por tu Júlio Dinis ou
Eça. Quais metas ou programas curriculares... Foi assim e foi importante.
Ao mesmo tempo, cantava o Hino Francês com a Irmã Leonor.
Tenho um fraquinho gigante pelo Francês, aprendido desde a fonética até à
literatura. Tudo ao pormenor. Dura, rígida e sem permeabilidade, a Irmã Leonor.
Depois, a minha Professora Marina, de Inglês. Amiga da Mãe e,
só por isso, poderia ter sido o meu pânico. Nunca. E o tanto que aprendi
naquelas aulas... Duras, também, mas ainda hoje cá estão.
Com o secundário, uma mão cheia de mestria. O Padre Ramos,
meu professor de Latim, que nos levava muito além das declinações (que ainda sei
de cor, Padre Ramos; orgulhe-se). Sei que
lhe dei água pela barba mas sei também que, em cada reprimenda, me ajudou a
crescer. Tenho tantas saudades suas... Um dia deste, hei de ir vê-lo (já lhe
prometi isto, não foi? Não mudo, querido Professor).
E a minha Professora Irene, carinhosa, meiguinha e que sempre
tem a bondade em tudo o que faz? Aquelas aulas de Francês... numa sala
pequenina, onde éramos quase seus filhos. Outra amiga da Mãe e outra Professora
da minha vida.
Já na fase final, alguém que me fez gostar de História, num
12.º cheio de sonhos e de medos. A Prof. Leonor, capaz de transformar o meu
pior pesadelo em conteúdos que lembro de cor. Recordo quando falámos a II
Guerra e o 25 de abril. Quanto entusiasmo... o tal que nos faz dar o salto de
algo entediante para a mais interessante das matérias. A importância do futebol
e das massas na época moderna... Se alguma vez eu disser que não gosto de
História, é mentira.
E o Amor de Perdição
da Prof. Maria João? A familiaridade com a família Maia? O entusiasmo com Cesário Verde ou Pessanha? As declamações de
Pessoa? Aquela Ode Triunfal? Conseguirei reproduzir partes de muitas aulas, tal
a vida que ali se entregava...
[Colegas e amigas da Mãe, também... (não tive uma vida fácil).]
Subi o patamar para a universidade. Desci o do entusiasmo e
da entrega dos professores. Que me perdoem, mas, de tantos, guardo dois no
coração: o Prof. Joaquim e o extraordinário Prof. Simão Botelho. Da
linguística, os dois. De aulas vivas, terra-a-terra, verdadeiros casos de
estudo pela diferença, num mundo de aulas repetidas há décadas. Mestres
na verdadeira aceção desta palavra. Não me marcou o ensino superior. Muito
pouco.
Volto atrás. Falta aquele que foi O Professor (o meu). O meu
Prof. Manuel. O Professor que pouco sorria mas que foi, sem dúvida, um exemplo,
um marco. Lembro-me da primeira frase que aprendi em Grego. Das declinações,
dos verbos, das técnicas de tradução. Lembro-me de como nos incutia a
importância e o valor da educação e dos sacrifícios para que ela fosse valiosa.
O meu Prof. Manuel, que rezava o terço enquanto fazíamos a prova, para que nos
corresse bem; quem nos fazia ver que devíamos procurar a raiz, o querer saber mais e, ao mesmo tempo, o
saber ser. Pedia-me que seguisse Clássicas
e eu que queria Direito. Voltava a pedir, que precisava de alguém que lhe
seguisse os passos. E eu que queria Direito. Fiz-lhe a vontade, dois anos mais
tarde. Eu, que queria Direito...
São estes os lugares cimeiros da minha lista de educadores e
criadores de sonhos e de quem sou. De professores se fizeram os meus anos. Com
bons Professores me fui fazendo. Um dia, talvez seja um pouquinho de cada um
deles...
Eu, a filha, sobrinha, prima e amiga de professores, que não
queria ser professora.
Acabei a ensinar.
📖🙏📖
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