de quando "se evolam tantos anos"

"E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos"

Tenho comigo estes versos de David Mourão-
-Ferreira, sempre, como que num constante lembrete do que são os dias que passam. E assim foi 2023, um carrossel imparável de emoções que tanto fazem sorrir, como, no instante seguinte, trazem as lágrimas incontidas de quando dói.

Conseguimos, a meio do ano – 1 de julho de boa memória - pôr as duas miúdas mais fixes do planeta a receber abraços e beijinhos mil, a dizer que sim à fé que cresce lá dentro. Caímos, logo depois, no cinzento dos dias, certos de que é na resiliência que se escreve o nome deste apelido de que nos batizaram. Vamos à luta, sempre, iremos e vamos mais, quando é preciso, porque sabemos que somos (muito) capazes.

Foi embora a Madrinha, dois meses depois. Perguntava a Kikó por que “é que ela não sai da caixa” e quem “conduz até ao Céu”. Saberemos, sempre, minhas filhas, que aquela caixa tem o nome da entrega e que, quando ela se fechou, a Mãe fechou o livro onde se escreveram os capítulos mais importantes dos seus 43 anos.

Não te escrevi ainda, Madrinha, que a assimilação também não chegou. Fui até procurar a tua prenda de Natal, um casaco com bolinhas brancas ou um perfume dos que cheiram mesmo bem. Livros, já não, que a paciência não abunda nos últimos tempos.

Esta é a foto do meu ano, tirada há cerca de quatro décadas. Na muralha do Castelo, tem nela, o colo e o abraço que, sendo meus, se multiplicaram infinitamente, por tantos. Em 2 de setembro, fechou-se o meu capítulo da infância. Creio que parei nesse dia, quando o telefone tocou. Fechou-se o meu bonito capítulo da infância. E eu que a acreditei imortal….

Foi cinzento, 2023. Cinzentão.

Pela janela transmontana que agora olho, vejo o arco-íris de 2024. Assim espero.

 “E por vezes”

E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos  E por vezes

encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites   não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos

David Mourão-Ferreira

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