"no peito vai-me um país"



Não pensava, por estes dias, escrever sobre política. Não pensava sequer, nos próximos tempos, fazê-lo. Guardo, no entanto, em mim, uma enorme vontade de chamar nomes a alguns ursos que nos governam, em que não votei mas que, em nome da democracia e da liberdade, assumiram o comando do meu país e da minha terra. Faço-o agora, ao rever-me na voz de uma senhora que, em desespero, chorava e dizia “Eu odeio o primeiro-ministro.” Minha senhora, não a conheço, mas sinto e grito, silenciosa, o mesmo. Eu e milhares de portugueses a quem um grupo de capitalistas que não sabem o que é a vida, não sabem o duro que é (sobre)viver, tiraram a esperança, a alegria dos dias.

Sempre fui de esquerda, sempre se respirou esquerda em casa. Lembro-me do MASP e do MARV e dos nervos em que ficava, nos domingos à noite, das autárquicas em que o MARV estava envolvido. Lembro-me de que queria muito ter 18 anos para votar, para me filiar. Ouvia Zeca Afonso e ainda agora escrevo ao som de Pedro Barroso. Foi a esquerda que fez a revolução, senhores. A esquerda.

Irritam-me pseudo-intelectuais que cantam “Grândola” e depois levantam bandeirinhas ao inenarrável som de “pão, povo e liberdade”. Qual pão? O que não há nas mesas do meu país? Qual povo? O que chora e odeia o primeiro-ministro? Qual liberdade? A que privatizou o meu país ou a que não me deixa escolher o meu futuro? Ursos.

Escrevo agora porque me senti tocada. Porque senti uma revolta que já não se contem, de uma professora reformada a quem tiram a tranquilidade dos dias, depois de anos a formar pessoas. Tiveram professores senhores ministros, senhores secretários de estado e adjuntos e adjuntos de adjuntos? Ou apenas estudaram em colégios de elite, onde não entra a realidade do bairro da cidade? Pois…. Lágrimas de desespero? Creio que não dá para ver entre os vidos fumados dos carros pretos ou da janela do último andar do ministério. Ursos.

Admito as diferenças e partilho conversas diárias com amigos e família de outros quadrantes. Essa é a liberdade que, em 1974, conquistaram por mim e que hoje me comove até ao arrepio. Mas perdoem-me a intransigência e a mente fechada de que me possam acusar. Não votei naquele senhor nem no que governa a minha terra. Jamais votarei à direita.

Aprendi também, ao longo da vida, a amar o próximo. Lamento desiludir quem mo ensinou. Eu não gosto do senhor que me governa e, para ele, desejo o mesmo que ele me deseja a mim: que vá para longe, emigrante e, se possível, fique por lá. Burra, eu, que por cá fico e quero ficar.
Afinal, (coincidências do meu som de fundo):
viva quem canta
que quem canta é quem diz
quem diz o que vai no peito
no peito vai-me um país

* Caro Seguro, se algum dia me ler: conquistou-me. Confesso não ter, até hoje, grande expectativa em si. (Também o meu partido se faz de homens e não há homens perfeitos.) No entanto, sei que são ainda os afectos que nos movem e a sua impotência, as suas lágrimas, o seu afago, a sua partilha da dor comoveram-me e moveram-me ao ponto de tornar público este texto. Obrigada.

** A quem vota no domingo e ainda está indeciso: na pior das hipóteses, fiquem pelo branco. Lembrem-se do meu Zeca que sempre dizia que “eles levam tudo, eles levam tudo e não deixam nada”…

*** A quem vota à direita: se ainda não perceberam, um dia hão de perceber que os erros se pagam caro.

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